terça-feira, 27 de março de 2012

JUSTIÇA NÃO PODE TER IMAGEM ARRANHADA

O GLOBO
27/3/2012

Os números com o balanço da atuação do Tribunal de Justiça do Rio, revelados em reportagens do GLOBO, dão forma a uma evidência inquestionável: uma das mais bem equipadas Cortes do país, e também uma das mais produtivas, ainda tem injustificáveis pontos de névoa se sobrepondo à transparência que se exige em todas as instâncias do Poder. Quando se trata de julgar agentes públicos envolvidos em denúncias de improbidade administrativa, a Justiça fluminense delonga punições e agiliza remissões.
É neste descompasso - rapidez para perdoar ou demora para punir - entre ações dos magistrados que se vislumbra, no meio da turvação, um perfil que desdoura o balanço do TJ. Na ponta em que predomina a leniência, o Tribunal do Rio consagra uma lerdeza que se mede por um magro índice de apenas 6% de ações transitadas em julgado contra maus agentes públicos desde o início da vigência da Lei de Improbidade Administrativa, há 20 anos (70 casos encerrados em 1.209 processos).
Há casos extremos, como a condenação de um policial à perda de cargo público 15 anos depois de ajuizada a ação por improbidade - quando a sentença já não produziria efeito, pois o réu já se aposentara. Além de macular a imagem de um Poder que é a última instância de defesa da sociedade, esse tipo de desapreço de magistrados com as obrigações dos seus postos também resulta em danos ao Erário. Chega a R$ 4,6 bilhões a soma dos valores que deixaram de voltar aos cofres públicos, em razão de processos não levados a julgamento. No outro vértice, o da presteza, também há episódios suspeitos. O juiz Rafael Fonseca, que absolveu em tempo recorde um prefeito de Itaguaí, é alvo de representações na Corregedoria da Corte - uma delas com referências a ligações perigosas do magistrado com uma milícia.
A situação não se restringe ao Rio. A inapetência judicante, por exemplo, se reproduz em tribunais de outros estados. No Amazonas, o Tribunal de Justiça registra apenas uma ação com condenação definitiva. Em Pernambuco, são apenas seis ações transitadas em julgado. Na Bahia, o número de processos finalizados não passa de 13. Mas é no próprio corpo do Poder Judiciário que se produz o antídoto contra a omissão. São Paulo contabiliza 1.844 casos resolvidos; o Rio Grande do Sul, 574; Paraná, 429 e Santa Catarina, 305. São índices que mostram o quanto se pode fazer quando há vontade política de se fazer o certo. Em razão da renitência do Judiciário em, pelos mecanismos de seus próprios tribunais, punir desvios funcionais, cresce a importância do Conselho Nacional de Justiça, e da sua Corregedoria. Não à toa, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o papel do CNJ nas ações de cobrança da magistratura de compromisso com a missão judicante. O órgão agora se debruça sobre as atividades do TJ fluminense, não só em relação a tramitações processuais, mas igualmente na fiscalização da evolução patrimonial do corpo funcional da Corte, prerrogativa igualmente assegurada pelo STF. Como em todas as atividades, também na Justiça há bons e maus agentes públicos. Cumpre, no caso, identificar aqueles envolvidos em atos de malversação e, se for o caso, puni-los, descolando a imagem da instituição, para preservá-la, de atos desabonados pela sociedade.

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